Rio de Janeiro, 12 de abril de 2020
Olá, pessoas do futuro!
Meu nome é Carlos Eduardo, tenho 43 anos, e estou enfrentando, junto com uma parte da Humanidade, a pandemia de Corona Vírus (oficialmente, COVID-19). Como a prevenção mais eficaz é a Quarentena, para diminuir o número de contágios e, por conseguinte, de mortes, estou há quase um mês sem sair de casa. Felizmente, não moro sozinho. Tenho a companhia de meu esposo, Rodolfo, de 34 anos, e de nossos filhos: Tilda, uma gatinha, e Pingo, um pinguim (na verdade, ele é um bichinho de pelúcia, mas nunca tivermos coragem de contar-lhe isso e seguimos o tratando como um ser vivo).
Hoje é domingo de Páscoa. Apesar de não sermos cristãos, é um dia importante para nós. Muitas famílias em nosso país, o Brasil, costumam se reunir nesse dia, numa celebração motivada mais pelo fortalecimento dos laços afetivos do que por questões religiosas. As nossas famílias são assim (a minha e a do Ro, que, desde 2008, quando nos casamos, se tornaram uma só). Dessa vez, não pudemos estar juntos. Contudo, trocamos mensagens, lembrando o quanto nos amamos e comentando os cardápios que faríamos para o dia especial (descreverei o nosso mais adiante). Enfim, nos desejamos felicidade, apesar de tudo. “Tudo”, neste caso, é a saudade, a incerteza sobre o futuro, o medo do desemprego (em alguns casos), da contaminação, da perda de nossos parentes mais velhos (embora os mais jovens possam morrer também, claro).
Como o nosso compromisso maior é com a vida e a sobrevivência, decidimos fazer a melhor Páscoa que estivesse ao nosso alcance. Eu e Rodolfo estamos trabalhando em casa (somos professores universitários) e os domingos já são, normalmente, nossos dias de folga. Portanto, o que fizemos hoje foi juntar, à nossa rotina domingueira, o momento de celebrar a Páscoa. A parte “normal” foi composta por acordar tarde e brincar com as “crianças”, sobretudo com a Tilda, que é um pouco mais ativa que seu irmão e gosta de jogar arames (desses que vêm fechando as embalagens de pão de forma). O esporte consiste em que ela fique parada num canto da casa, em posição de ataque, esperando que os pais chutem o arame para ela dar o bote e pagá-lo no ar. Em outros momentos, ela mesma o chuta e espera que façamos o mesmo, numa partida de futebol bastante heterodoxa… Ainda na programação dominical rotineira, assistimos a muitos DVDs. Somos cinéfilos e gostamos de colecionar filmes, a que quase nunca temos tempo de assistir. Agora, essa tem sido nossa maior diversão (também costumamos assistir a filmes em plataformas digitais, assim como a peças de teatro, óperas e lives de nossos artistas preferidos – mas fazemos isso durante a semana, à noite).
Outra prática comum do dia foi chegar à janela para gritar contra o presidente da república, Jair Bolsonaro, único caso no mundo de um governante que é contra a Quarentena. Os protestos foram combinados pelas redes sociais e, na hora marcada, nos aproximamos da janela para apitar, gritar, bater panelas, de modo a ecoar nossa insatisfação com a atitude homicida do chefe do Executivo. No entanto, não são todos que estão insatisfeitos. Em meio aos gritos, é possível ouvir algumas vozes (poucas, é verdade) que o defendem. Trata-se, em nossa opinião, de um infeliz encontro de suicidas com o homicida-mor.
Já a parte “pascoal” de nosso dia foi vivenciada com hambúrgueres artesanais feitos por nós (fazer a própria comida é um modo de garantir as baixas calorias e não engordamos durante a Quarentena) e de um bolo de chocolate coberto com creme de avelã (esta parte foi off-dieta, claro… rs!). Talvez vocês estranhem que hambúrgueres tenham sido escolhidos como uma refeição de Páscoa, mas decidimos fazer uma extravagância, nos dando o prazer de comer algo de que gostamos muito e nos dá muito prazer (na maior parte do tempo, estamos mantendo uma dieta balanceada, com muitas frutas e legumes). Também pedimos ovinhos de Páscoa, tanto para matar a vontade, quanto para ajudar os entregadores, que dependem dos pedidos para sobreviver economicamente. Somos gratos por sua atuação, que nos permite manter a Quarentena, apesar da tristeza de saber que as pessoas são submetidas ao perigo por não terem outros meios de sobrevivência – a ajuda orçamentária aos pobres afetados pela pandemia, proposta pela esquerda e já aprovada, está demorando a ser entregue porque o presidente Bolsonaro ainda não assinou. Embora não tenha sido o caso dessa vez, preferimos fazer pedidos a pequenos comércios do bairro, de modo a auxiliar sua manutenção. Quando os ovinhos chegaram, sua bela e festiva embalagem foi desinfetada com álcool gel, antes de nos deliciarmos (aliás, cheiro de álcool virou praticamente sinônimo de receber compras em casa).
Após terminarmos nossa refeição especial e assistirmos ao último filme do dia, fomos dormir. A manhã seguinte é sempre uma incógnita, mas amenizamos essa sensação ordenando bem nossas tarefas com listas diárias, estabelecendo uma rotina que nos permite ter a sensação de que algo está sob controle. Afinal, o mais importante é viver uma hora de cada vez, um dia de cada vez, e alimentar a fé de que, num futuro próximo, tudo estará relativamente bem, novamente.
Abraços,
Carlos Eduardo, Rodolfo, Tilda e Pingo
Salvador de Bahia, Magda:
Ficar em casa, dia após dia, faz com que a gente tenha tempo, muito tempo, para pensar e repensar.
Uma das coisas que sempre me passa pela cabeça é que, se alguém afirmasse que o mundo todo ficaria preso em casa eu iria dizer que ele estava louco. E aqui estamos nós, praticamente todos os continentes em suas quatro paredes.
Moro na frente do mar, clima quente e fico olhando a praia cercada, proibida. Às vezes no final da tarde, dou uma fugida e mergulho. Nado para bem longe evitando olhares reprovadores, principalmente por ser do chamado “grupo de risco”. Tenho 68 anos.
Acho que muitas pessoas acreditam que depois dos 60 anos as pessoas tendem a ficar mais tranqüilas, mas eu não faço parte deste grupo. Para mim, cada dia que fico preso é sufocante. Gosto de andar, correr, nadar, velejar, passear com os cachorros. Gosto de conversar até com estranhos costumo iniciar uma conversa por qualquer motivo. O simples fato de não se ter escolha, de não poder abraçar uma pessoa que eu goste, desespera.
Tenho sorte de ter muito espaço em casa e muita coisa para fazer. Inclui no meu roteiro, substituindo a academia, a prática de ginástica e pilates utilizando as sugestões da internet – muito bom. Lógico que com todo esse tempo disponível me dedico a cozinhar, fazer pão.
Pela manhã um pequeno passeio com os cachorros, evitando passar por perto de qualquer pessoa. Os meus amigos caninos me olham recriminando que os passeios são curtos. Tento explicar, mas parece que não me entendem!
Depois, café da manhã, louça limpa. Como sou administradora de um grupo relativamente grande de notícias no Facebook dou início à leitura dos sites e dos comentários. Algumas curtidas, alguns comentários deletados, solicitações de novos membros analisadas.
Pequenas olhadas para o mar. O desejo de estar velejando. O calor…
Quando percebo tenho que começar a providenciar o almoço.
A tarde ler, atualizar o site e às vezes assistir um filme na Netflix. Atividade física e sempre que possível um mergulho – lava a alma!
Final de tarde, relatório da Covid, site de notícias, noticiários, (assisto 3 diferentes emissoras). Acabou o dia!
Às vezes bate uma tristeza, mas passo logo a borracha para dar lugar à esperança que tudo isso acabe logo.
Saudades dos abraços – adoro abraçar pessoas que eu gosto.
Herzliche grüsse aus Salvador!
Magda